Entre a longa Cordilheira dos Andes e o
Oceano Pacífico, no país mais esticado do mundo, está o maior deserto
latino-americano, o chileno Atacama. A aridez domina a região e os municípios
próximos - são quase 1.500 km de extensão onde a média de chuvas é de 0,1 mm ao
ano, com áreas onde a água fica sem cair por séculos. Nesse mar de sequidão,
fica a região de Coquimbo, no município de Chungungo, que é banhado pelo mar, e
onde choveu apenas cinco vezes em todo ano de 2013. Na área, a média histórica
de chuvas é de apenas 100 mm ao ano - contra 1.500 mm em São Paulo, por
exemplo. Mas, ao contrário da capital paulista, aqui não falta água - é
possível tirá-la do ar.
O
que acontece em Coquimbo é que faltam chuvas, mas sobram nuvens hiperúmidas.
São as "nieblas costeras", que se formam sobre a orla, se movem em
direção ao continente e acabam aprisionadas por uma serra, num fenômeno chamado
de camanchaca, as "chuvas horizontais". A camanchaca acontece em condições muito específicas
de geografia, clima e correntes marítimas, e é bem comum ao longo do litoral
peruano e chileno. Essa neblina é composta por minúsculas gotas de água, que,
de tão leves, se mantêm suspensas no ar. Se a nuvem encontrar algum tipo de
obstáculo, as partículas de água se chocam umas com as outras e começam a se
concentrar. Alcançam, então, peso suficiente para cair, virar gotas de água, e
deixar um rastro de umidade por onde passam. Nas regiões em que o fenômeno
acontece, é comum encontrar árvores eternamente encharcadas e animais com os
pelos molhados o tempo todo. A umidade é visível por aqui. Nas altitudes entre
600 e 1.200 metros, onde o fato é mais intenso, a vegetação é abundante e
frondosa - ao contrário das zonas em que as neblinas costeiras não acontecem, e
que têm solo seco e pouca flora. Foi observando esse contraste que, há 50 anos,
pesquisadores da Universidad de Chile tiveram uma ideia: se a água não cai das
nuvens, será que daria para pegá-la de dentro delas? Assim nasceu a ideia
dos atrapanieblas (em português, algo como
"capta-nuvem") - artefatos criados para tirar, literalmente, água do
ar.
As
engenhocas são simples: basta esticar malhas de polietileno de alta densidade
(parecidas com as que são usadas para proteger plantações do sol), de até 150
metros de largura, entre dois postes de madeira ou aço. A neblina passa pela
malha, mas os fios de plástico retêm parte da umidade, que condensa, vira água
e escorre até uma canaleta que leva a um reservatório (veja mais no info). O
negócio é barato e eficiente: cada metro quadrado da malha capta, em média, 4
litros de água por dia, e um atrapaniebla de
40 m2 custa entre US$ 1.000 e 1.500. Para melhorar, o modelo é 100%
sustentável. Não atrapalha a flora e a fauna, e funciona durante quase o ano
todo, o que torna possível planejar a produção de água. Mas não para por aí: a
verdadeira vantagem é que os atrapanieblas não
utilizam luz elétrica. Diferentemente de outros métodos caros de obtenção de
água em regiões secas, como a dessalinização do mar, eles não precisam de
energia para funcionar. O vento trata de espremer as nuvens pelas malhas, e a
gravidade cuida de carregar a água até os baldes. Perfeito.
Infelizmente, o projeto não é
replicável no mundo todo por causa das condições necessárias de clima e
temperatura. Mas países como México e Peru também utilizam a técnica. No árido
Estado de Querétaro, na região central do México, e nas secas áreas costeiras
do Peru - que inclui a capital Lima, onde a média anual de pluviosidade é de
menos de 10 mm, mas cuja umidade relativa do ar chega a 98% -, o projeto já
funciona em larga escala. O maior complexo de malha do mundo, contudo,
localiza-se em Tojquia, Guatemala: são 60 captadores que, ao todo, compõem uma
rede de 1.440 m2 e captam quase 4 mil litros de água diariamente, abastecendo
cerca de 30 famílias. Sem gastar energia.
Fonte : Site Superinteressante
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